terça-feira, setembro 02, 2008

MAIS DE TRINTA ANOS ACOMPANHANDO GRÁVIDAS

Reproduzem-se, aqui, largos excertos de um artigo de Jaime Pereira Forjaz de Sampaio, médico-obstreta, com larga experiência no campo da sua profissão, sempre exercida com grande dignidade, reflexo das suas invejáveis qualidades humanas:
Após mais de trinta anos a lidar diariamente com grávidas é fácil ter uma percepção muito aproximada dos assuntos que vou tratar a seguir.
A) Quando começa a vida? Toda a gente sabe que é no momento da concepção, isto é quando o espermatozóide penetra no óvulo e se dá a fusão do material genético dos dois núcleos, do espermatozóide e do óvulo e começa a divisão e diferenciação celular. Isto é um facto verdadeiro e como tal não existem argumentos que o possam contrariar. Invocar actividade encefálica, conceitos físicos e filosóficos sobre a vida e outras teorias, com o único intuito de a desvalorizar, não passa de conversa. Para a Medicina e para a Biologia a vida começa no momento da concepção e ponto final. Argumentar que o embrião não tem vida, porque algumas das suas faculdades ainda não se desenvolveram, é tão primário, absurdo e desonesto, como seria afirmar que um recém-nascido por não possuir a maturidade funcional para falar, andar ou comer bifes com batatas fritas, não tinha vida. (Não possui qualquer sistema de órgão funcional, por isso não tem vida, como defendia no Correio dos Açores do dia 16 de Janeiro um ilustre cientista da nossa praça. Para o cientista em questão um ser unicelular, como a amiba e a paramécia ou uma bactéria, não têm vida).
O problema é aceitar ou não que um ser humano saudável, com uma mãe saudável pode ser ou não morto, impunemente. Entretanto é um crime grave e dá cadeia, para quem matar e comer uns bifinhos de golfinhos, ou baleias, que só por mostrarem as caudas e os dorsos, darem grunhidos e umas cambalhotas, são considerados num patamar de dignidade superior ao próprio homem, por isso mais respeitados e defendidos na sua integridade física. Agora são as vacas, transportadas em viagens longas. Os tratadores vão ter aulas para lhes ministrar acções psicológicas, com intervalos máximos de oito, para lhes minimizar o stress. Por esse andar não tarda nada, que sejam proibidos os raticidas, os insecticidas e os antibióticos, pelo stress que o envenenamento causa aos ratos, formigas, pulgas, percevejos, bactérias e afins. Todos estes bicharocos colocados num patamar de dignidade superior ao do próprio homem. Ao que havíamos de chegar.
B ) Razões para abortar: Aborta-se quando se é adolescente, por imposição dos pais e não por vontade própria, por causa da vergonha que eles ainda julgam que é; aborta-se por pressão do marido, aborta-se porque é uma chatice ter de criar mais um filho e há coisas mais importantes a fazer; aborta-se porque se engravidou por libertinagem e desleixo ou ignorância e aborta-se, muito raramente, porque o método contraceptivo falhou. Mas nem uma vez me pediram para abortar por falta de condições económicas.
Quando querem abortar, a táctica é sempre a mesma: é tentar desvalorizar o feto, desde o biólogo do artigo do Correio dos Açores que afirma que os embrião não têm vida, passando por desculpas mais simplistas como, ainda não é nada, é só uma postinha e outras afirmações mais elaboradas, perfeitamente conscientes de que o período mais espectacular das nossas vidas é o período embrionário. De uma única célula passamos a ter a forma definitiva de seres humanos Crescemos em três meses vinte e cinco milhões de vezes e desde o princípio temos escrito no código genético toda a nossa evolução até morrermos. Somos tudo desde o princípio. É confrangedor ver o papel de certas mulheres, que se julgam superiores e bestiais, declararem que já fizeram um ou mais abortos como método contraceptivo numa clara e inequívoca confissão daquilo que são.
C ) Quando se desiste de abortar: Quando me aparecem grávidas que engravidam sem contar, e que à força querem abortar e as consigo convencer a prosseguir com a gravidez (muitas, felizmente, com plena satisfação minha e delas), até hoje, nenhuma se arrependeu, nem enjeitou o filho, que queria que fosse assassinado e vazado pelo esgoto de uma qualquer latrina, como primeira reacção à sua gravidez não planeada. Às vezes digo que tenham o filho e que fico com ele, mas até agora, também não tenho nenhum filho adoptivo. Também nunca tive nenhum caso de falência económica por terem deixado nascer mais um filho.
D ) Abortar não compensa, pela carga psicológica que vai ficar na consciência dos que na família estão envolvidos, particularmente na própria mãe. Se é verdade que o primeiro a matar é que custa mais, é sempre um fardo demasiado pesado para o resto da vida. A responsabilidade e o pesadelo perduram para sempre e não é possível voltar atrás. Isto é o que acontece, não é chantagem psicológica.
Há poucos anos ouvimos, na nossa televisão um pai muito revoltado por não ter sido diagnosticado um mongolismo e ainda por cima com uma grave malformação cardíaca e não ter sido feito o aborto dito terapeûtico. Sabem qual foi a primeira coisa que os pais fizeram quando o menino nasceu? Foi levar a toda a pressa, o filho que queriam ver morto, para o continente para que tratasse da sua cardiopatia e não morresse. Porque é que não o deixaram morrer em paz, se era esse o seu maior desejo?
E) Como se faz um aborto? Há várias maneiras, todas com violência para o embrião/feto. Vou só descrever uma delas, para ficarem elucidados.
Há uma técnica da procriação medicamente assistida, que consiste em pôr vários embriões dentro do útero e depois vão sendo mortos até ficarem um ou dois conforme o desejo materno. Como de costume não se fala em matar, chama-se a essa técnica --- redução embrionária ---, mesmo que já seja praticada na fase fetal.
Mata-se da seguinte maneira. O técnico, guiado por ecografia, mune-se de uma agulha suficientemente comprida, até conseguir espetá-la no coração dos infelizes. Como eles se mexem ao tentarem desviar-se das picadelas, estas vão-se sucedendo por todo o corpo. Após inúmeras tentativas e depois de bem bandarilhar e espicaçar em profundidade, conseguem penetrar dentro do coração, com o feto ainda vivo e então injectam uma solução de cloreto de potássio que provoca a paragem cardíaca. Morrem após terem sido torturados. Isto não os choca? Isto é legítimo?
Este tipo de assassinato não é pior do que ver o Saddam, com morte quase instantânea, dependurado, de língua vermelha e inchada, a sair-lhe pela boca fora? Como vimos, ficámos chocados, mas os que se vão seguir, não vamos ver e nem se vai falar nisso. Será que esse tipo de assassinato pode ser tolerado impunemente em seres humanos, tendo como único crime o facto de existirem? E quando passarem as dez semanas, é só dizer que a data da última menstruação foi em data posterior para se passarem a fazer abortos depois da data legal. Não há fiscalização, nem haverá, é tão fácil e dá milhões a quem os pratica!
F) Quais devem ser as acções do nosso Governo e do da República para evitar gravidezes indesejadas? Aos governantes cabe a responsabilidade de educar e ensinar no sentido de promover a liberdade responsável, em vez da libertinagem irresponsável.
(...).
Quem, entre nós, mais recorre ao aborto, não são dos estratos de mais baixo nível sócio económico da nossa sociedade e a razão não é financeira, mas cultural (uns comprimidos com prostaglandinas custam meia dúzia de patacos, ao alcance de qualquer um). Cá na ilha que eu tenha conhecimento, actualmente, não sei de ninguém que faça abortos, daí que duvide dos elevados números apresentados. Se os abortos são clandestinos, então os dados estatísticos são baseadas em meros palpites e suposições, sem qualquer credibilidade. E se fossem aos milhares ou mesmo às centenas, sem condições, iam-nos parar à urgência da Maternidade, o que não acontece.
É ainda obrigação do governo apoiar as mães com dificuldades económicas durante a gravidez e após o parto, o que também não acontece no nosso País. Em Inglaterra, quando uma mãe tem um filho defeituoso e se nega a abortar o Estado fornece todos os meios necessários e suficientes para apoiar esses pais, antes e após o nascimento e durante o crescimento dessa criança. E cá, quais são os apoios que essas crianças, mesmo saudáveis, têm para levar uma vida condigna e de igualdade de oportunidades, em relação aos mais afortunados? Nenhuma. E mais ainda, temos sido governados por partidos teoricamente do social e para o social com igualdade de oportunidades para todos.
G) Para terminar apenas dois comentários em relação a afirmações proferidas no debate televisivo na RTP Açores, no dia 12.1.2007.
Um dos intervenientes de que desconheço o nome, um Senhor Professor na nossa Universidade, afirmou que ser pelo sim é um sinal de progresso. Para mim é um sinal de retrocesso. Progresso é dar às mulheres a instrução e os ensinamentos necessários para que tomem as precauções correctas para evitarem gravidezes indesejadas e não passar-lhes um atestado de ignorância e irresponsabilidade. Torná-las responsáveis pela maternidade. Será progresso dizer: engravida à vontade, que não tens problemas, depois arranjamos uns médicos que assassinam o teu filho, as vezes que quiseres e que forem precisas? Matar, abortar e assassinar, são sinónimos, mas como é chato e incomoda, recorre-se aos eufemismos e diz-se, então, fazer uma IVG.
(...).