sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Aborto sem meias palavras

(por Ana Soares)

A pouco mais de uma semana do referendo sobre a liberalização do aborto, pensei se deveria ou não escrever outra crónica sobre este assunto. Decidi faze-lo por vários motivos, entre os quais os mails que tenho recebido (e que agradeço!) ora de apoio, ora de desacordo do último artigo que tive oportunidade de publicar neste espaço.
Nunca fui muito dada a eufemismos. Sempre achei que tratar as coisas pelos nomes e de modo directo só pode beneficiar qualquer discussão de opiniões, muito mais quando o que está em causa é a hipotese das mulheres adquirirem em Portugal o Direito ao aborto. Por isso o aborto aqui é chamado como tal e não por Interrupção Voluntária da Gravidez, apesar desta ser certamente uma expressão muito mais pomposa. Uma refeição eu posso interromper para atender um telefonema e depois retomá-la, bem como uma viagem, a leitura de um livro, não uma gravidez. Se é o aborto que se pretende referendar, só me ocorre que as constantes referências a IVG se façam porque mesmo aos partidários do sim lhes custa reconhecer o que defendem, um aborto, o fim de uma vida. Nem mais, nem menos.
Tão pouco admito falar que o referendo pretende a despenalização do aborto. Sejamos claros, colocando os floreados discursos jurídicos à parte. Se o sim vencesse, qualquer mulher que abortasse ás dez semanas e um dia seria julgada e o crime admitiria pena de prisão. A actual legislação permite o aborto em caso de violação, mal formação do feto e perigo para a vida da mãe. O que se nos pergunta, é se queremos que o aborto deixe de ser uma excepção para passar a ser um direito, como o direito à educação ou à liberdade de expressão.
Liberalizar é permitir algo sem qualquer restrição e é o que nos é proposto: aborto a pedido até às dez semanas. Optamos pelo Direito à vida e ao nascimento ou pelo ao Direito ao Aborto?
E os homens? Que lugar mínimo (para não dizer inexistente) é esse que o “sim” reserva para os homens deste país? Colocando as simpáticas cegonhas de parte, o homem não é um elemento estranho a uma gravidez. Numa sociedade em que a igualdade prima, como aquela em que acredito, o homem tem direito a pronunciar-se sobre o filho que também é seu. Se a gravidez não é algo que dependa apenas da mulher, se na educação dos filhos não é apenas a mulher que tem responsabilidade, no aborto também não o pode ser.
Muito se tem falado que o “não” é um voto de retrógrados, pessoas alheadas do seu tempo. Eu penso exactamente o oposto. Diz-me o dicionário que retrógrada é alguém cujo espírito está ultrapassado, alguém que é antiquado. Uma pessoa do século XXI não pode fechar os olhos às provas e avanços que a ciência vive no dia-a-dia. Se eu vejo os bébés nas ecografias, se até já existe a possíbilidade de intervenções cirúrgicas intra-uterinas e se os avanços a nível do DNA e código genético me mostram que ali já existe um ser humano que é já diferente dos Pais que lhe deram origem, por mais que tente tapar os olhos com uma peneira, o Sol acaba por brilhar...
O aborto existe. Temos que enfrentá-lo, mas apenas é possível com verdadeiras soluções, não pensos rápidos como o aborto legal (e não seguro como nos tentam fazer acreditar, uma vez que representa igualmente perigo para a vida das mulheres). O “não” apresenta soluções: políticas de apoio à família, apoio ás mães carenciadas, agilização do processo de adopção, educação sexual... Se “mais vale prevenir do que remediar” como se justifica que a oferta de métodos contraceptivos nos centros de saúde esteja a diminuir, dificultando um planeamento familiar consciente? Se todos reconhecemos os danos que o aborto causa – mesmo o “legal” – e se o Ministério da Saúde apoia a sua introdução no Sistema Nacional de Saúde, como se explica que o mesmo Ministério exija receita médica para a pílula mensal e não para a pílula do dia seguinte nem exija um parecer médico para viabilizar o aborto se o “sim” vencer? Eu faria exactamente o oposto. Porque dificultar o que tem menos danos e mais efectividade?
Há coisas que não consigo entender, fazem-me confusão! Se mesmo os defensores do sim dizem que são contra o aborto, qual o motivo para o serem? Suponho que as consequências para a mãe e o não nascimento de um bébé... Daqui apenas uma coisa posso concluir: estamos de acordo no fundamental do problema, mas não na solução. O meu “não” não é um não marcado por tabus nem preconceitos. O meu “não” não é definido por um partido ou religião. O meu “não” é consciente e capaz de apontar verdadeiras soluções e políticas a seguir. O meu “não” é ao aborto! O meu “sim” reservo-o para a dignidade da mulher, para o direito à vida do feto, para uma sociedade que estabelece realmente a igualdade entre sexos e para um futuro onde os Direitos sejam para somar, não para subtrair.

3 Comentários:

Anonymous Anónimo escreveu...

Era tão pequeno
que ninguém o via.
Dormia sereno,
enquanto crescia.
Sem falar, pedia
- porque era semente -
ver a luz do dia
como toda a gente.
Não tinha usurpado
a sua morada.
Não tinha pecado.
Não fizera nada.

Foi sacrificado
enquanto dormia.
Esterilizado
com toda a mestria.
Antes que a tivesse,
taparam-lhe a boca

tratado, parece,
qual bicho na toca.

Não soltou vagido.
Não teve amanhã.
Não ouviu : "Querido.."
Não disse : "Mamã ..."

Não sentiu um beijo.
Nunca andou ao colo.
Nunca teve ensejo
de pisar o solo,
pezito descalco,
andar hesitante,
sorrindo no encalço
do abraço distante.

Nunca foi a escola
de sacola ao ombro,
nem olhou estrelas
com olhos de assombro.
Crianças iguais
a que ele seria,
não brincou com elas
nem soube que havia.
Não roubou maçãs,
não ouviu os grilos,
não apanhou rãs
nos charcos tranquilos.
Nunca teve um cão,
vadio que fosse
a lamber-lhe a mão,
à espera do doce.

Não soube que há rios
e ventos e espaços.
E Invernos e estios.
E mares de sargaços,
e flores e poentes.
E peixes e feras -
as hoje viventes
e as de antigas eras.

Não soube do mundo.
Não viu a magia.

Num breve segundo,
foi neutralizado
com toda mestria:
Com as alvas batas,
máscaras de entrudo,
técnicas exactas,
mãos de especialistas
negaram-lhe tudo
(o destino inteiro ...)

- porque os abortistas nasceram primeiro

2/02/2007 04:46:00 da tarde  
Anonymous Anónimo escreveu...

Era tão pequeno
que ninguém o via.
Dormia sereno,
enquanto crescia.
Sem falar, pedia
- porque era semente -
ver a luz do dia
como toda a gente.
Não tinha usurpado
a sua morada.
Não tinha pecado.
Não fizera nada.

Foi sacrificado
enquanto dormia.
Esterilizado
com toda a mestria.
Antes que a tivesse,
taparam-lhe a boca

tratado, parece,
qual bicho na toca.

Não soltou vagido.
Não teve amanhã.
Não ouviu : "Querido.."
Não disse : "Mamã ..."

Não sentiu um beijo.
Nunca andou ao colo.
Nunca teve ensejo
de pisar o solo,
pezito descalco,
andar hesitante,
sorrindo no encalço
do abraço distante.

Nunca foi a escola
de sacola ao ombro,
nem olhou estrelas
com olhos de assombro.
Crianças iguais
a que ele seria,
não brincou com elas
nem soube que havia.
Não roubou maçãs,
não ouviu os grilos,
não apanhou rãs
nos charcos tranquilos.
Nunca teve um cão,
vadio que fosse
a lamber-lhe a mão,
à espera do doce.

Não soube que há rios
e ventos e espaços.
E Invernos e estios.
E mares de sargaços,
e flores e poentes.
E peixes e feras -
as hoje viventes
e as de antigas eras.

Não soube do mundo.
Não viu a magia.

Num breve segundo,
foi neutralizado
com toda mestria:
Com as alvas batas,
máscaras de entrudo,
técnicas exactas,
mãos de especialistas
negaram-lhe tudo
(o destino inteiro ...)

- porque os abortistas nasceram primeiro

2/02/2007 04:46:00 da tarde  
Anonymous Anónimo escreveu...

Era tão pequeno
que ninguém o via.
Dormia sereno,
enquanto crescia.
Sem falar, pedia
- porque era semente -
ver a luz do dia
como toda a gente.
Não tinha usurpado
a sua morada.
Não tinha pecado.
Não fizera nada.

Foi sacrificado
enquanto dormia.
Esterilizado
com toda a mestria.
Antes que a tivesse,
taparam-lhe a boca

tratado, parece,
qual bicho na toca.

Não soltou vagido.
Não teve amanhã.
Não ouviu : "Querido.."
Não disse : "Mamã ..."

Não sentiu um beijo.
Nunca andou ao colo.
Nunca teve ensejo
de pisar o solo,
pezito descalco,
andar hesitante,
sorrindo no encalço
do abraço distante.

Nunca foi a escola
de sacola ao ombro,
nem olhou estrelas
com olhos de assombro.
Crianças iguais
a que ele seria,
não brincou com elas
nem soube que havia.
Não roubou maçãs,
não ouviu os grilos,
não apanhou rãs
nos charcos tranquilos.
Nunca teve um cão,
vadio que fosse
a lamber-lhe a mão,
à espera do doce.

Não soube que há rios
e ventos e espaços.
E Invernos e estios.
E mares de sargaços,
e flores e poentes.
E peixes e feras -
as hoje viventes
e as de antigas eras.

Não soube do mundo.
Não viu a magia.

Num breve segundo,
foi neutralizado
com toda mestria:
Com as alvas batas,
máscaras de entrudo,
técnicas exactas,
mãos de especialistas
negaram-lhe tudo
(o destino inteiro ...)

- porque os abortistas nasceram primeiro

2/02/2007 04:46:00 da tarde  

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