quarta-feira, novembro 15, 2006

Luz e trevas

António Castro Poças*

O assunto da Interrupção Voluntária da Gravidez, ou, vernaculamente, O Aborto, assume proporções e provoca tensões tais que se julgaria depender do sim ou do não do referendo que irá ter lugar, a salvação do país, a recuperação económica – que vai tardando – a entrada no plantel dos grandes deste mundo.
A lei portuguesa define quando se deve encarar essa interrupção da gravidez e, concordando-se ou não, temos de a respeitar.
Este será o segundo referendo que irá realizar-se para conhecer a opinião dos portugueses acerca do tempo de gravidez em que esta pode ser voluntariamente interrompida, sem correr o risco de penalização judicial que, até agora, tem pesado sobre a mulher.
Em resumo, pretende-se saber se a maioria da população concorda, ou não, que o aborto praticado até à décima semana de gravidez passa a ser legal e isento de penas.
A interrupção voluntária da gravidez, ou aborto, consiste, básica e iniludivelmente, na eliminação de uma vida que está em gestação, a vida de um embrião humano que não pode defender-se e que tem nos seus progenitores o seu carrasco.
Este ser humano embrionário não está visível, ainda não chora, não clama, não se vê como ele sente o golpe – qualquer que seja a forma de o desferir – que vai pôr termo à sua curta existência e por isso aquela, ou aqueles, que determinam o seu termo ficarão, talvez, aliviados do tremendo peso que é o de decidir o que vive e o que morre.
Até parece que se pretende que este acto violento seja mais um contraceptivo para colmatar os descuidos ou as facilidades das relações sexuais.
Não seria mais lógico que se providenciasse pela protecção inequívoca e eficiente das grávidas e das crianças, de modo a que a gravidez não constituísse estigma, embaraço, problema ou dificuldade ?
A natalidade decresceu em Portugal e por este andar, dentro de algumas décadas extinguir-se-á a raça portuguesa. Ficarão alguns velhos para contar a outros povos porque desapareceu uma Nação.
É evidente que a situação económica da maioria da população impede, também, a natalidade. Ter capacidade financeira para educar três, quatro ou mais filhos, não está ao alcance senão de poucos casais. E também se verifica que a maioria destes poucos casais não deseja ter muitos filhos, por comodismo, porque não têm preparação para os educar convenientemente e porque não querem prescindir da sua liberdade de movimentos para conviver e atender às necessidades psíquicas dos seus descendentes.
As solicitações sociais dos tempos de hoje são pródigas em programas de lazer, de ocupações de tempos livres nas mais diversas actividades lúdicas e os jovens casais não querem perder pitada destas diversões e por isso não estão junto dos filhos quando eles deles precisam – e precisam sempre ! – daí resultando uma relutância em ter uma prole numerosa – já consideram que mais de dois é um tormento – ou, divorciarem-se das suas obrigações paternais e deixá-los entregues ao acaso, o que não lhes incutirá, de modo algum, o estímulo familiar e gerando-lhes a propensão para não ter descendência por recordarem o abandono a que foram votados e não terem, dentro de si, o cadinho que dá, em abundância, o amor salutar que os laços de pais e filhos conseguem criar.
Este amor é a luz que permite a difusão de uma humanidade sã e que, pelos seus numerosos exemplos, constitui o glorioso baluarte das Nações.
O aborto não é mais que a treva que tudo impede, que não deixa que o futuro exista, que mata o amor, que cria o deserto, que afunda as Nações. Sem gente não há comunidades, há o vazio e este é o nada de tudo o que poderia ser.
É pena que não possa ser divulgado através de toda a população portuguesa o admirável artigo publicado no passado dia 9 – quinta-feira – neste jornal, da autoria do Dr. Paulo Mendo, dado que constitui uma pedra basilar na apreciação do assunto que envolve o aborto e seria de uma utilidade flagrante para as pessoas que irão votar no referendo.
Temos ouvido as mais diversas opiniões sobre este tema e espanta-me que certas pessoas cultas e evoluídas defendam, com uma frieza impressionante, o direito ao aborto, como se isso fosse mais uma arma de arremesso contra as posições defendidas pela religião católica que pugna, sempre, pela vida, uma vez que eles se proclamam de ateus, agnósticos ou simplesmente opositores acérrimos às doutrinas da igreja de Roma. Para atacar uma ideia não hesitam em condenar uma vida, sem julgamento ou motivo, mesmo fortuito. Salvaguardem-se os casos previstos na lei.
E é de uma tristeza profunda ouvir mulheres a proclamar que são elas que mandam nas suas barrigas. Pois mandam, mas não tem autoridade sobre a vida que estão a gerar, a qual não pediu para ser concebida e que, como qualquer ser humano à face da terra, tem o mesmo direito de existir.
Já pensaram, esses defensores impiedosos do aborto, que se os seus pais assim pensassem eles não andariam por este mundo ? E não digo que não fariam falta, como já ouvi, porque toda a gente tem o direito inegável à sua vida, mas é lamentável que se ocupem mais da sua extinção do que da sua protecção e não se proponham lutar por melhores condições de vida para que mães e crianças tenham o amparo e a assistência necessárias para usufruírem em pleno o benefício que a natureza lhes concede.

Escreve, quinzenalmente, às quartas-feiras no Primeiro de Janeiro