Para que ninguém vote enganado
(por Cristina Líbano Monteiro)
O PÚBLICO divulgou uma sondagem de opinião, na qual o "sim" à "despenalização" do aborto até às dez semanas de gravidez alcançava uma clara vitória, com quase 70 por cento das intenções de voto. Porém, em caixa à parte, apontava contradições nos resultados. Na verdade, dizia, a "maioria dos votantes não autoriza IVG por "desejo" da mulher". Ou seja: a acreditar nesta sondagem, o "sim" ganharia afinal com os votos dos que não aceitam o aborto a pedido, com os votos, portanto, dos que quereriam votar "não".
Por estranho que possa parecer - e é isto que interessa sublinhar -, num referendo que muita gente considera de enorme importância para o país (uma questão prioritária, informava ainda o inquérito), uma boa parte dos portugueses ainda não percebeu o que está em causa. Gente rude, pouco dotada, distraída? Talvez não. Provavelmente, gente vítima de um jornalismo, de uma televisão, de uma rádio, de pretensos esclarecedores ou fautores da opinião pública que - por incompetência ou má fé, pouco importa para o resultado final - não consegue explicar aos eleitores, ou não deixa que quem consegue o explique, que no dia 11 de Fevereiro só deve votar "sim" quem acha que o aborto a pedido, simplesmente por desejo da mulher grávida, há-de ser autorizado até às dez semanas de gravidez.
Votar "sim" significa que se está de acordo em que uma mulher, cuja vida ou saúde não estão ameaçadas pela gravidez, deve poder abortar impunemente o filho, em princípio saudável, que vive nela como fruto de relações sexuais livremente mantidas; acrescendo que ninguém a questionará sobre os motivos do seu desejo e, se porventura o fizer, a resposta poderá limitar-se a um simples "porque sim". Em suma: apenas hão-de votar "sim" aqueles e só aqueles que concordem que, até às dez semanas de gravidez, a sociedade deve conceder à mãe o poder de dispor livremente da vida do filho.
Todos os outros, os que não se revêem no que acaba de ser dito, incluindo os que entendem justificado um aborto nos casos de risco para a vida ou para a saúde da mãe, de malformação ou doença grave do feto, de gravidez resultante de violação ou outro crime contra a liberdade sexual, todos esses devem votar "não". Porque votar "não" mantém intocado o regime vigente - previsto desde 1984 no art. 142º do Código Penal -, segundo o qual a "interrupção da gravidez" já não é crime precisamente nessas circunstâncias, ou seja: se for realizada para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida; se for de prever que o filho virá a sofrer de doença grave ou malformação congénita incuráveis; se a gravidez tiver resultado de crime sexual. Estes casos -repete-se - já são permitidos e não fazem parte da pergunta do referendo.
Votar "não" significa, portanto, apenas e justamente, opor-se a que as leis do país passem a autorizar o aborto a pedido, o aborto por simples desejo da mulher.
De uma vez por todas e para que ninguém vote enganado: não se fale mais de crianças deficientes ou mal-formadas, de mulheres violadas ou em desespero por a sua saúde não aguentar uma gravidez levada a termo. Abortar nessas situações dramáticas há muito que não é crime em Portugal. E tão-pouco passará a sê-lo se ganhar o "não" no próximo dia 11 de Fevereiro.
Basta de desinformação.
Num Estado de direito democrático, enganar os eleitores ou deixá-los no erro em que se encontram representaria mais do que uma estratégia ilícita de vitória. Esvaziaria de conteúdo a votação em causa, retirando-lhe até a pretensa capacidade de legitimar - ao menos no plano político - a mudança de lei que alguns propõem.
O PÚBLICO divulgou uma sondagem de opinião, na qual o "sim" à "despenalização" do aborto até às dez semanas de gravidez alcançava uma clara vitória, com quase 70 por cento das intenções de voto. Porém, em caixa à parte, apontava contradições nos resultados. Na verdade, dizia, a "maioria dos votantes não autoriza IVG por "desejo" da mulher". Ou seja: a acreditar nesta sondagem, o "sim" ganharia afinal com os votos dos que não aceitam o aborto a pedido, com os votos, portanto, dos que quereriam votar "não".
Por estranho que possa parecer - e é isto que interessa sublinhar -, num referendo que muita gente considera de enorme importância para o país (uma questão prioritária, informava ainda o inquérito), uma boa parte dos portugueses ainda não percebeu o que está em causa. Gente rude, pouco dotada, distraída? Talvez não. Provavelmente, gente vítima de um jornalismo, de uma televisão, de uma rádio, de pretensos esclarecedores ou fautores da opinião pública que - por incompetência ou má fé, pouco importa para o resultado final - não consegue explicar aos eleitores, ou não deixa que quem consegue o explique, que no dia 11 de Fevereiro só deve votar "sim" quem acha que o aborto a pedido, simplesmente por desejo da mulher grávida, há-de ser autorizado até às dez semanas de gravidez.
Votar "sim" significa que se está de acordo em que uma mulher, cuja vida ou saúde não estão ameaçadas pela gravidez, deve poder abortar impunemente o filho, em princípio saudável, que vive nela como fruto de relações sexuais livremente mantidas; acrescendo que ninguém a questionará sobre os motivos do seu desejo e, se porventura o fizer, a resposta poderá limitar-se a um simples "porque sim". Em suma: apenas hão-de votar "sim" aqueles e só aqueles que concordem que, até às dez semanas de gravidez, a sociedade deve conceder à mãe o poder de dispor livremente da vida do filho.
Todos os outros, os que não se revêem no que acaba de ser dito, incluindo os que entendem justificado um aborto nos casos de risco para a vida ou para a saúde da mãe, de malformação ou doença grave do feto, de gravidez resultante de violação ou outro crime contra a liberdade sexual, todos esses devem votar "não". Porque votar "não" mantém intocado o regime vigente - previsto desde 1984 no art. 142º do Código Penal -, segundo o qual a "interrupção da gravidez" já não é crime precisamente nessas circunstâncias, ou seja: se for realizada para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida; se for de prever que o filho virá a sofrer de doença grave ou malformação congénita incuráveis; se a gravidez tiver resultado de crime sexual. Estes casos -repete-se - já são permitidos e não fazem parte da pergunta do referendo.
Votar "não" significa, portanto, apenas e justamente, opor-se a que as leis do país passem a autorizar o aborto a pedido, o aborto por simples desejo da mulher.
De uma vez por todas e para que ninguém vote enganado: não se fale mais de crianças deficientes ou mal-formadas, de mulheres violadas ou em desespero por a sua saúde não aguentar uma gravidez levada a termo. Abortar nessas situações dramáticas há muito que não é crime em Portugal. E tão-pouco passará a sê-lo se ganhar o "não" no próximo dia 11 de Fevereiro.
Basta de desinformação.
Num Estado de direito democrático, enganar os eleitores ou deixá-los no erro em que se encontram representaria mais do que uma estratégia ilícita de vitória. Esvaziaria de conteúdo a votação em causa, retirando-lhe até a pretensa capacidade de legitimar - ao menos no plano político - a mudança de lei que alguns propõem.
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